quinta-feira, janeiro 29, 2004

Jorge Palma - Estrela do Mar

Numa noite em que o céu tinha um brilho mais forte
e em que o sono parecia disposto a não vir
fui estender-me na praia sozinho ao relento
e ali longe do tempo acabei por dormir

Acordei com o toque suave de um beijo
e uma cara sardenta encheu-me o olhar
ainda meio a sonhar perguntei-lhe quem era
ela riu-se e disse baixinho: estrela do mar

Sou a estrela do mar
só a ele obedeço, só ele me conhece
só ele sabe quem sou no princípio e no fim
só a ele sou fiel e é ele quem me protege
quando alguém quer à força
ser dono de mim

Não sei se era maior o desejo ou o espanto
mas sei que por instantes deixei de pensar
uma chama invisível incendiou-me o peito
qualquer coisa impossível fez-me acreditar

Em silêncio trocámos segredos e abraços
inscrevemos no espaço um novo alfabeto
já passaram mil anos sobre o nosso encontro
mas mil anos são pouco ou nada para a estrela do mar

sexta-feira, janeiro 23, 2004

O simulácro

Os seus olhos choravam sangue. O ranger dos dentes ecoava um som agonioso de ódio e tristeza. Não se preocupava mais em conter as suas entranhas, vomitava guinchos ardentes... indignos de um homem. As lágrimas deturpavam a sua vista e a chuva, batendo ritmicamente no parabrisas, acompanhava numa penosa sinfonia.
Fazem-nos acreditar nos filmes que a nossa vida desfila em frente dos olhos quando encaramos a morte, em flashes doces e amargos. Nunca nos avisaram que poderia acontecer com uma morte alheia, sobre o sangue de um terceiro. Sobre o sangue de um amado.
Como um pião sobre o asfalto, os pensamentos rodopiavam pelos finos axónios do seu cérebro, materializando electricamente aquilo que poetas e pintores ambicionam nos seus criativos.
O fim está próximo.
Os dedos agarravam violentamente a superfície do volante - falta pouco. A voz gelationosa cantava agora a canção mais triste de todas enquanto suavemente largava a direcção. O veículo virava guinchando como um animal moribundo. O mundo parece silenciar quando gira pela ultima vez. Nem sentia as buzinas, nem sentia os movimentos agressivos. O último estrondo tudo silenciou - "Desculpa..."

segunda-feira, janeiro 19, 2004

Tempo para!

Aparentemente o tempo nunca para.
Todos os momentos são consequência do momento imediatamente anterior. Os carros não param.
Todos os momentos são a continuidade de algum bafo de existência. O vento não para.
Todos os momentos são rápidos e fugazes. As pessoas não param.

Há no entanto momentos onde o tempo parece parar. Uma bolha envolvente que isola, que protege, que pacifica. Os carros param, o vento para, as pessoas param. A pele parece emanar música, uma melodia que atordoa. Os lábios parecem tecer um lençol de serenidade. Os cabelos ondulam como um curso de água que grita.

Tempo para!! E ele parou... como há muito não fazia.

sexta-feira, janeiro 16, 2004

... ando desiludido com a vida... cada vez perco mais a Fé na Humanidade:

No outro dia, uma rapariga telefonou-me e disse: "Queres vir cá a casa? Não está cá ninguém." Eu fui... não estava mesmo ninguém....

quinta-feira, janeiro 15, 2004

...mais um relato de um despegado com tempo a mais nas mãos...

Hoje ía atravessar uma grande e movimentada rua de Lisboa, quando me deparei com uma dakelas caixinhas com um botão para por o semaforo dos peões verde...

Toda a gente sabe q estes dispositivos NÃO FUNCIONAM!!! ou se sim é puro engano. Algum responsável pla manutenção dos semáforos se enganou...

Então qual será a verdadeira razão da existência destas caixinhas? Decorativo certamente não, pois aquilo não deve nada à beleza. Morrer electrocutado??? Um pouco mórbido de mais, não? Uma das mais fortes possibilidades, parece-me, é aquilo servir de passatempo! Ou seja, vai um transeúnte inocentemente na sua vidinha patética, para no sinal vê aquilo e pensa, como um belo carneirinho domesticado, "deixa cá carregar no botão que quero passar em segurança e é este o comportamento q aprendi a fazer e não o questiono por nada!!!". O tempo passa e meia hora depois, quando uma leve suspeição de aquilo não servir p´ra nada surge no horizonte, o semáforo fica verde , a duvida é esquecida, e lá vai o indivíduo, contente com o bom funcionamento do equipamento da sua cidade, sem sequer suspeitar que o que aconteceu foi que, simplesmente, o tempo do semáforo estar vermelho acabou mudando assim o seu estado...

Ora, o que este vosso despegado se lembrou foi... Aquilo serve, nada mais nada menos, para diminuir o fluxo de trânsito de maneira a que possamos atravessar a estrada aínda de sinal vermelho!!! Como tal acontece, ou é realizado, não sei nem vislumbro qualquer hipótese, mas acredito muito que esta seja a verdadeira razão pra existencia d´aquilo!!!

Genial... ou talvez não!!!

terça-feira, janeiro 13, 2004

História de amor de um despegado (contada cronologicamente)

Hoje enquanto trabalhava no talho conheci uma rapariga, ela é muito bonita.

Ela regressou ao talho. Começamos a conversar, ela chama-se Cidália. É um nome bonito. Ela é empregada de limpeza no LIDL e em part-time diz que trabalha num bar. Não percebi o nome do bar, mas tinha um nome de uma terra qualquer do Médio Oriente.

Onteontem ela encontrou-me no café e eu sentei-me na mesa dela. Ela pareceu nervosa. Acho que devia ter mudado de roupa depois de sair do trabalho.

Esta tarde segui-a do LIDL até casa. Ela mora numa casa muito bonita. Ela vive com a bisavó que é cega e cospe sangue quando tosse. Tem um cão. Devia ter percebido isso antes de me aproximar do portão. Fiquei no centro de saúde até ás 2 da manhã.

Voltei a segui-la. Ela reparou que eu estava atrás dela e começou a andar mais depressa. Eu comecei a correr. Ela entrou no posto da polícia. Achei melhor ir para casa.

Esta noite fui á casa dela. Desta vez levei um bife que enchi de bagaço e embebedei o cão. Ainda me doi da ultima vez. Consegui roubar algumas peças de roupa interior. Acabei por descobrir que eram da avó. Guardei-as na mesma.

Hoje fui ás compras ao LIDL. Não queria comprar nada. Só queria vê-la. Ela viu-me. Chamou o segurança. Ele pôs-me na rua. Depois bateu-me. Eu fiquei á porta á espera que ela saísse. Ela não saiu. Saiu o segurança. Bateu-me outra vez.

Querido diário, desculpa ter ficado os ultimos 2 meses sem escrever nada. Há 2 meses atrás segui novamente a Cidália. Ela ficou muito nervosa. Não percebi porquê, eu desta vez mudei de roupa. Quando a apanhei num beco ela começou a gritar. Eu disse que a amava. Ela deu-me um pontapé. Se tivesse sido na virilha até não tinha sido grave. Mas ela parece que falhou e acertou-me um pouco ao lado. Doeu. Fiquei no beco a gemer de dor, ela fugiu. Passado dez minutos apareçeram uns rapazes. Disseram que eram irmãos dela. Um era preto. Não percebi. Bateram-me. Doeu muito. Acordei na manhã seguinte no Hospital com escoriações multiplas e um olho vazado. Passado 2 semanas saí do hospital. Á porta do hospital estava um polícia. Fui a tribunal por perseguição. Não percebi de quem. Estive preso até agora. Soube que a Cidália foi para Espanha. Acho que estou triste.

Hoje conheci uma rapariga no Talho. Lembrei-me da Cidália.

Uma noite no casino

As luzes oscilavam irritantemente, os sons cintilantes das moedas e o burburinho omnipresente preenchiam o pavilhão. Noite de casino. Sorrisos amarelos, pessoas de plástico e um fulano idiota que sorri para mim estampado numa nota.
A noite corria mal. Todas as apostas eventualmente se reverteram numa perda de orçamento que progressivamente se encurtava e atingia agora limites baixos e agoniosamente perigosos. 100 contos nas mãos. Nada lá fora, nada cá dentro... tudo nas mãos.
A serenidade aparente nada escondia, apenas ligeiros acessos de demência derivados de um capitalismo carnívoro. No meio da névoa, uma mesa de jogo. Apesar de aparentemente banal algo de confortavel emanava daquele pano verde, um pouco sujo das beatas que caíam sinuosamente.
Duvida: jogar e arriscar? A "trifurcação" era inevitavel.
Jogar e ganhar: salvar a noite, engordar o orçamento e quem sabe a auto-estima e ao mesmo tempo relançar os dados num outro jogo.
Jogar e perder: mãos vazias, joelhos a raspar no chão. Perda total e a impossibilidade futura de arriscar seja o que for.
Não jogar: agarrar firmemente as notas. Sair pela porta sem nunca saber se os dados estavam de facto a sorrir ou se simplesmente era eu que lhes vertia simpatia.
Tic Tac Tic Tac... Trifurcação. Nunca pensei que o tempo fosse um factor determinante. Mas foi, a mesa deixou de sorrir e a hesitação levou ao terceiro caminho - o mais equilibrado, mas não necessariamente o mais são.

A vacilação é a origem da monotonia. A monotonia é a origem...

O comportamento feminino explicado (de um despegado para outro)

Se ela sorri para ti, das duas uma: ou está com caimbras na cara ou está alguém muito bonito por trás de ti.

Se ela te dirige a palavra: ou vai pedir-te alguma coisa (dinheiro, lume, uma mecha de cabelo...) sem segundas intenções ou vai avisar-te que se continuas a olhar para ela com esse ar obcessivo ela não terá problemas em usar o seu spray de pimenta nos teus belos olhos ramelosos.

Se ela se rir de uma piada tua: ou é loira e só está a rir porque sabe que é esse o comportamento a seguir "após uma piada" ou então está a gozar contigo (podes comprovar isso pelo tom agressivo e gozão do riso)

Se ela perguntar se pode almoçar contigo: ou precisa de se colar a ti para entrar numa cantina publica ou vai comer e depois "vai á casa de banho" deixando a choruda conta tooooda para ti.

Se ela te beijar: esquece, esta hipotese nem se põe.

IMPORTANTE: nunca, mas nuuuuuuuunca, interpretes estes comportamentos como algo favorável.

Despegado num buraco espaço-tempo

Há uns tempos atrás aconteceu-me algo muito estranho! Tava a olhar para um relógio digital, para os digitos dos segundos... agora vocês dizem "caramba mas quem é q perde tempo a olhar para os digitos dos segundos de um relógio digital? O relógio era giro? Era especial de corrida? Fazia ... magiiiiaaaa????" e eu digo "nop um relogio normal, da casio se bem me lembro..." e vocês "caramba, então não te queixes de ser despegado, que com esses hobbies na vais longe, amigo" e eu "mas só faço isso porque tenho tempo livre a mais, efeito de ser despegado..." e vocês "mas com esse tempo livre podes, por exemplo, passear, ler o Harry Potter ou o livro da Margarida «loira» Pinto..."

Acho que me estou a dispersar... adiante:

Tava na boa a ver os segundos a passar, quando de repente vejo ISTO acontecer: 07, 08, 09, 08, 09, 10... !!!ISTO É VERÍDICO!!! mas, mas, mas, mas... Que se passou? Bug do relógio? Bug da matrix? Estariam a proceder a alterações na estrutura da matrix?

Um turbilhão de ideias se formou dentro da minha cavidade craniana! (muito) Mais tarde e com muito custo cheguei a uma conclusão:

entrei inadvertidamente num buraco espaço-tempo, ou dito de outra maneira mais fashion, sucedeu, ali em minha casa, um time-warp... A mim!!! um simples Despegado... Parece que o facto de estarmos alguns minutos a olhar para os digitos dos segundos dos relógios digitais acciona algum tipo de thriger do espaço-tempo... e isso abre um vasto leque de várias e loucas possibilidades a serem discutidas e aproveitadas!!! Talvez, com alguma concentração consigamos mesmo viajar nestes worm holes:

- "Nuno que fazes a olhar tão fixamente para esse relógio e com esse taco na mão?"
- "Vou matar uns quantos Dodos à paulada... "

Hey!!! Isso levanta outro tipo de discussão! Querem lá ver que EU fui o causador da extinção destas estúpidas aves? wicked...

segunda-feira, janeiro 12, 2004

What Is It? (just felt like writing in english)

Is it the lack of timing?
Is it the lack of words?
Is it the lack of a motif?
Is it the lack of courage?
Question marks that cover a lifetime of failure and insecurity. Lucky the world spreads beyond the thick web of love affairs. Unlike the voice who trembles, I don't think it's going to be a glorious day. I don't feel my luck could change. Not for now.

5 dicas para se manter despegado

1. Mantém o mau aspecto (se este for natural, então deixa-te estar)
2. Tem conversas produtivas com o sexo oposto: fala de MicroMachines, Mega Drive e da tua colecção de selos
3. Acaba com a tua vida social: falar com pessoas, sair de casa, sair á noite... é expressamente proíbido.
4. Não tenhas sentido de humor: se quiseres dizer uma piada faz com que seja seca ou que fira os sentimentos das pessoas
5. Parte do princípio que se foste despegado até agora, serás despegado durante muito mais tempo (provavelmente o resto do tempo)

Sou um Tampax

Pois é, a vida de um despegado é dura. Qualquer despegado conhece os dissabores diários de o ser e enumera-los num blog sería ainda mais deprimente. No entanto eu enquadro-me numa "alegre" classe de despegados, o despegado Tampax. Seinfeld escreveu "Para as mulheres, um amigo rege-se pelas mesmas normas de um Tampax: podem ir para a piscina com ele; podem montar a cavalo; dançar..., mas, a única coisa que não podem fazer com ele é ter relacões sexuais". E não, isto não é uma questão meramente sexual, apenas achei piada ao termo. Sou o amigo da minha amiga. Acho que nada explica melhor isto que um excerto do texto original do Seinfeld:

"Até hoje pensava que a pior frase que podia ouvir de uma rapariga era:
"Temos que falar...". Mas nao! A pior frase de todas é: "Eu tambem gosto de ti...mas como amigo." Isto significa que para ela tu és o mais simpatico do mundo, aquele que melhor a compreende, o mais dedicado... mas nunca vai sair contigo."


É agreste a vida de um despegado.
Vejam o texto completo do Seinfeld para perceberem, vale a pena! :)

sexta-feira, janeiro 09, 2004

E assim começa a existência dos Despegados... Mentes solitárias com muito pouco para fazer... Longa vida ao blog (e curta duração ao "desapego")!