quarta-feira, março 17, 2004

Numa esplanada perfumada

Os olhares começaram a trocar-se metros antes. Ele aproxima-se e agarra a fria cadeira de ferro - "Posso?". O levantar de sobrancelhas é objectivo, mas é prontamente reforçado por uma palavra "Claro". Os movimentos apreensivos e atabalhoados faziam-se notar nos dois, equanto ele se acomoda. A tensão da mesa numero 12 contrasta fortemente com a restante esplanada, relaxada e sorridente.
É notorio o esforço que ambos fazem por evitar o contacto ocular e os frequentes reposicionamentos de cotovelos e mãos traduzem o nervosismo vergonhoso.
João cerra os olhos e junta as palmas das mãos sobre a mesa como que tomando a iniciativa de dialogo, abra a boca mas é interrompido pela rapariga. "Não tem que estar aqui... se isto estiver a ser incomodo, por favor, saia" - a resposta é imediata "Não, não! fui eu que insisti, por favor...".
Bárbara abana a cabeça enquanto fita vagamente o chão e morde os lábios.
"Isto é uma situação... ...estranha" - confessa João enquanto dobra um guardanapo. "É"...
"Eu já o vi... lembra-se?"
"A sério? Tu eras tão nova... hum, perdão, prefere que a trate por você?"
"Não, está bem assim, a diferença de idades justifica!"
Um sorriso breve e a conversa é reatada, apesar da reticência
"...É estranho... tu és tão parecida com a minha avó"
"A nossa"
"Quê?"
"A noss..."
"Ah sim, sim, sim... pois!" - João esfrega agora a cara com as mãos e retoma o diálogo em seguida.
"Realmente... uma pessoa pensa nestes momentos mas..."
Perante a pausa de reflexão Bárbara intervém
"Eu perçebo que isto pareça muito especial, mas nós não temos nada em comum... Só vim por sua insistência e devo dizer-lhe que isto é... extremamente desagradável"
"Eu percebo... Eu percebo..." Um longo suspiro transparece um espirito de desistência. "Isto é uma má ideia, não há nada que possa fazer que dê significado á tua vida"
"A minha vida sempre teve um significado... como pode ser tão egocêntrico?"